Universidades públicas brasileiras: do que nos acusam?

A semana que se foi marcou, profundamente, o calendário das vidas institucionais das universidades públicas brasileiras pelo abuso de poder e o autoritarismo sem medidas. Quando invadem a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a segunda melhor entre nós, em uma operação batizada de “Esperança Equilibrista”, trata-se de mais que uma provação ao nosso hino da Anistia, entoado pela eterna Elis Regina. É, verdadeiramente, uma afronta às casas que formam mulheres e homens, rumo à construção de um outro país, sem conciliação de classes.
Pensei que chorar junto com Marias e Clarices, no solo do Brasil, em irreverência a tantas outras que partiram “num rabo de foguete”, era página virada de um tempo que NUNCA MAIS, deveríamos dizer: “Chora a nossa pátria, mãe gentil”... E como esses fatos nos tem feito chorar. Choramos por que não sabemos do que nos acusam.
Do que nos acusam mesmo? De gerenciar com eficiência, as demissões em massa de trabalhadores(as) pais e mães de famílias que vivem décadas sonhando com suas aposentadorias, para descansar seus corpos desgastados pela força perversa dos seus labores? De aprender suas tabelas matemáticas que devemos comprar serviços aos invés de investir, cuidadosamente, em capacidades humanas?         
De criarmos métricas quase inatingíveis, um funil, que exclui a entrada dos filhos(as) dos(as) verdadeiros(as) produtores(as) das riquezas do país, para que tenham acentos em cadeiras confortáveis, os herdeiros das elites empresariais financistas?  E quando tentamos romper as regras, somos anarquistas, revolucionários inconsequentes. É disso que nos acusam?
Ou será por que produzimos ciência no Brasil, com as migalhas que sobram, melhor, que caem das malas e dos armários das casas grandes? Ainda assim, as cientistas negras e pobres, doam suas vidas, literalmente, para que na ciência, tal como na vida, sigamos teimando, insistindo, resistindo em fazer perguntas, mesmo quando sabemos a resposta, quais as razões fundantes da face da ciência ainda ser colorida com rostos de homens brancos, em centros voltados para o desenvolvimento do capitalismo sem partilhas. É disso que nos acusam?
Nos acusam de que? De assistir passivamente às mortes físicas, mentais, éticas e morais dos nossos colegas, pela desenfreada, suja e triste competição, cujas regras foram ditadas por essa ordem contaminada por interesses individuais e egoístas. De nos fazer acreditar que estamos “fora da lei” ao administrar nossos projetos de pesquisas, emaranhados por uma burocracia perversa. Burocracia que nos faz acreditar que somos “todos bandidos incompetentes”, igualmente violadores das leis que regem a administração pública e seus órgãos de controle. Levando-nos a abrir mão de nossas cadeiras de pesquisadores(as), professores(as), educadores(as) que somos, responsáveis pelo zelo à construção sócio política de ambientes civilizados, doutos(as) na produção de saberes e práticas à defesa do desenvolvimento do Brasil, para habitarmos ao lado de quem nos fazem acreditar que são “fora da lei” de forma pensada, deliberada, dividindo as celas com os donos do poder?
De que estamos sendo acusados? De não sermos aparelhos reprodutores do “culto ao autoritarismo” e à ameaça constante de punirmos uns aos outros em terríveis processos penais, oriundos de assédios, usos indevidos do poder e desumanos atos de vingança por não pensarmos igualmente. Em uma verdadeira marcação, ensaios de imposição à criação de ambientes com pensamentos únicos, rodeados de amigos(as) por conveniência, a manutenção de um fácil e fraco poder, profundamente ENRAIZADO, na superioridade das forças de mercados, e no completo desprezo dos valores da humanidade, parte deles, expressos nas políticas públicas e sociais, frutos de lutas históricas de mulheres e homens que não se rendem à perda do respeito e valor da vida do seu próximo, bem ali, do lado.
Não se rendem ao pânico que tentam imprimir por meio das ações policiais, concretizadas nas circunvizinhanças dos moradores de bairros, ruas, de seres discriminados, desrespeitados e agredidos por razão da cor de suas peles, pela estética que dizem agredir aos olhos, classes sociais, orientação e identidade de gênero, e ou opositores políticos. Será que somos acusados por não diferenciarmos uma perseguição política, das banalizações das mortes mais violentas de mulheres e homens, negros(as) e pobres?
Somos acusados de que? De ensinarmos e aprendermos com essa nova geração os compromissos que devemos ter para que aprofundemos os princípios democráticos de uma sociedade livre. Fiquemos em alerta pois o rumo que os governos atuais podem nos levar, nos arriscam ao retorno das vicissitudes que deram VIDA longa ao regime militar, com suas forças conservadoras, partícipes de governos ao centro “democrático” que teimam em quebrar a autonomia das universidades públicas brasileiras, nos ameaçando com o congelamento por duas décadas dos investimentos necessários, nos transformando em quitandas de vendas de alimentos como agrotóxicos e medicamentos para matar a saúde. E ainda, há muitos dos burocratas desavisados, que chamam isso de estado eficiente.
Estão nos acusando do que? De seguir perguntando, junto aos nossos estudantes, em como é possível um estado democrático de direito no Brasil, se nem todos são iguais perante a lei? Pois, dizem eles: “aqui não é lugar para aprender as ciências da humanidade, para debates à política. Em nossas escolas, não há lugar para partidos, mas sim para violência entre professores e estudantes, para doenças mentais, suicídios, salários miseráveis, cargas horárias de trabalho desgastantes, condenações, linchamentos públicos, inseguranças, desrespeitos e outros males que nos levam à depressão coletiva e ai suicídio”. Saibam, neste lugar que desejam edificar, ninguém se educa.
Colegas da UFMG, não se suicidem, eles não merecem nossas vidas, pois já perdemos muitas ao longo do estado de milícia, e não queremos NUNCA MAIS, perder, nenhuma vida, muito menos nos submetermos aos arbítrios e abusos não compatíveis com o estado de direitos.  

Portanto, em nome dos valores da democracia e da liberdade, não queremos nenhum “bêbado trajando luto...” Porque sabemos que nos acusam de cantar em defesa das universidades públicas, gratuitas e inclusivas... então cantemos com Vanda Otero e Alex Pochat, a composição dePaulo Costa Lima, em comemoração aos 70 anos da Universidade Federal da Bahia(UFBA)

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